Receita Federal altera tributação sobre ganhos com ações judiciais

Compartilhar este artigo

20152955661_4cc2b2d634_k

Fonte da Imagem: Freepik

Cobrança de 34% de IRPJ e CSLL pelo Fisco será feita só na primeira compensação entre créditos e débitos.

A Receita Federal baixou a guarda sobre um tema que tem movimentado os tribunais – especialmente em razão da chamada “tese do século”. O órgão mudou o entendimento sobre o momento em que devem ser tributados os ganhos obtidos com as ações judiciais.

O contribuinte, ao vencer a disputa, precisa deixar na mesa, para a União, 34% dos valores que têm a receber. Essa fatia é referente ao recolhimento de Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL que incidem sobre o acréscimo patrimonial da empresa.

Desde 2003, a Receita Federal entendia que essa tributação tinha de ser paga no momento do trânsito em julgado, quando não cabe mais recurso. Com a decisão favorável e o processo encerrado, portanto, o contribuinte deveria, imediatamente, repassar tais quantias à União.

Agora, está mais flexível: a cobrança será feita na primeira compensação, ou seja, depois que o contribuinte habilita o crédito perante a Receita e faz uso desse valor para quitar tributos correntes. Esse novo entendimento foi publicado pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) no Diário Oficial da União de ontem. Consta na Solução de Consulta nº 183, norma que deverá ser aplicada pela fiscalização em todo o país.

A mudança, segundo advogados, pode ter efeito sobre a judicialização. As discussões sobre a tributação dos ganhos provenientes de ações judiciais se tornaram frequentes na Justiça com a chamada “tese do século” – que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins.

A explicação está nos valores envolvidos nessa disputa. Levantamento do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) estima que a “tese do século” tenha gerado R$ 358 bilhões em créditos fiscais para as empresas.

Ninguém quer desembolsar altas quantias para pagar imposto antes de colocar as mãos no dinheiro, segundo especialistas. Era isso o que acontecia com o entendimento anterior da Receita Federal, que estabelecia a tributação do ganho já no trânsito em julgado – antes, portanto, de os contribuintes realizarem as compensações (uso do crédito para quitar tributos correntes).

As empresas recorreram ao Judiciário com pedidos diferentes. Algumas delas alinhadas à nova regra, ou seja, para que a tributação ocorra na primeira compensação.

Isso porque, no momento do trânsito em julgado, diz Leo Lopes, sócio do FAS Advogados, as companhias não sabem exatamente qual é o seu crédito. Mandados de segurança, geralmente usados para contestar cobranças fiscais, não fixam um valor. O contribuinte tem que fazer os cálculos e apresentar à Receita.

“Com a tributação ocorrendo na primeira compensação, os contribuintes podem utilizar o próprio crédito para quitar essa tributação”, afirma Lopes.

Não significa, no entanto, que essa discussão será encerrada. Grandes companhias, principalmente, as que faturam acima de R$ 78 milhões por ano, e têm direito a quantias altíssimas por causa da “tese do século”, entendem que a tributação deve ocorrer na medida em que forem utilizando o crédito.

Se tem R$ 1 bilhão, por exemplo, e compensa R$ 200 milhões somente, tributaria só essa parcela. Depois, tributaria-se o restante. É diferente do modelo estabelecido pela Receita Federal: se tem R$ 1 bilhão, terá que tributar todo esse valor de uma vez só, no momento em que fizer a primeira compensação.

Há empresas ainda que entendem por outro momento, posterior: o de homologação das compensações. A Receita tem prazo de cinco anos – contados da data em que a declaração de compensação tributária foi apresentada pelo contribuinte – para fiscalizar e homologar ou não os créditos.

Quem defende esse marco temporal diz que somente com a homologação pela Receita Federal é que os valores reconhecidos pela decisão judicial tornam-se certos, líquidos e exigíveis.

“Não há um posicionamento definitivo do Judiciário sobre essa questão, mas há uma tendência favorável ao contribuinte”, observa João André Buttini de Moraes, do escritório Buttini Moraes Advogados.

O advogado Luca Salvoni, do escritório Cascione, cita que no Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, com sede em São Paulo, três turmas têm decisões para que a tributação ocorra somente no momento da homologação dos créditos. São pelo menos duas na 3ª Turma (processos nº 5000708-42.2020.4.03.6111 e nº 5004691-74.2019.4.03.6114), uma na 4ª Turma (processo nº 5010177-15.2020.4.03.0000) e outra na 6ª Turma (processo nº 5013313-53.2020.4.03.6100).

“Esses contribuintes não vão desistir das suas ações. Ao contrário, quem ainda não judicializou vai judicializar”, diz Salvoni.

No ano passado, os contribuintes usaram créditos fiscais para quitar R$ 63,6 bilhões de impostos – 174% a mais do que havia sido registrado em 2019. A Receita Federal atribuiu o forte crescimento das compensações à “tese do século”.

Neste ano, a previsão de escalada é ainda maior. As compensações tributárias feitas pelos contribuintes atingiram R$ 67,592 bilhões de janeiro a abril, impulsionadas pela utilização dos créditos envolvendo a “tese do século”. Isso indica um avanço real de 40,37% sobre o mesmo período de 2020.

Advogados afirmam que um número grande de ações transitou em julgado depois de maio, mês em que o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu a tese. Esses processos estão desaguando em novas e volumosas compensações.

Conteúdo relacionado

Ganhos decorrentes de incentivo fiscal não compõem base de IRPJ e CSLL, diz STJ

Os ganhos obtidos por uma empresa mediante incentivo fiscal concedido por programa estadual de desenvolvimento econômico não devem compor a…

Leia mais

Receita Federal notifica contribuintes para regularização de benefícios fiscais relacionados ao ICMS

Em um movimento recente que tem gerado muitos desdobramentos no universo fiscal, um número significativo de contribuintes que se beneficiaram…

Leia mais

Juiz decide que empresas não precisam recolher IRPJ e CSLL sobre Selic

O juiz Felipe Graziano da Silva Turini, da 2ª vara Federal de Piracicaba/SP, concedeu liminar determinando à Receita Federal que…

Leia mais
Podemos ajudar?