Julgamento do dia 29/04: exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins

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Fonte da Imagem: JOTA/STF

Nesse caso, é inadmissível a modulação, visto que os contribuintes confiaram no comando exarado pelo STF.

Após o julgamento do RE nº 574.706, em repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou o tema 69 nos seguintes termos: “O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins”.

Em face da decisão proferida, a Procuradoria da Fazenda Nacional opôs embargos de declaração – os quais inclusive serão julgados no próximo dia 29 de abril – requerendo, em suma, que (i) seja esclarecido pela Corte Suprema se o ICMS a ser excluído da base de cálculo das contribuições em comento seria o valor pago ou o destacado; bem como (ii) seja aplicada a modulação de efeitos para que a decisão judicial proferida atinja apenas as situações ocorridas após o julgamento dos embargos.

Com relação ao primeiro argumento, cabe observar que, tanto no RE nº 240.785, como no RE 574.706, o STF já analisou a matéria em questão, concluindo pela exclusão de todo o ICMS incidente nas operações, especialmente o destacado.

De fato, nos termos do § 3º, do artigo 489 do Código de Processo Civil, a decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé. (g. n.)

Tendo como base essa premissa, analisemos o precedente firmado em repercussão geral nos autos RE 574.706, levando em consideração a conjugação de todos os seus elementos, inclusive os votos vencidos, tal como determina o dispositivo processual em referência.

Com efeito, a ministra relatora Carmen Lúcia afirma em seu voto que: “Desse quadro é possível extrair que, conquanto nem todo o montante do ICMS seja imediatamente recolhido pelo contribuinte posicionado no meio da cadeia (distribuidor e comerciante), ou seja, parte do valor do ICMS destacado na ‘fatura’ é aproveitado pelo contribuinte para compensar com o montante do ICMS gerado na operação anterior, em algum momento, ainda que não exatamente no mesmo, ele será recolhido e não constitui receita do contribuinte, logo ainda que, contabilmente, seja escriturado, não guarda relação com a definição constitucional de faturamento para fins de apuração da base de cálculo das contribuições”. (grifos nossos)

O ministro Edson Fachin – que não acolheu o pedido do contribuinte, mas cujo entendimento integra o julgado[1] – afirma que o Superior Tribunal de Justiça, nos autos do RESP nº 1.144.469 (em repetitivo), decidiu que o “valor do ICMS, destacado na nota, devido e recolhido pela empresa compõe seu faturamento, concluindo, no seu entender, que o faturamento, espécie do gênero receita bruta, engloba a totalidade do valor auferido com a venda de mercadorias e a prestação de serviços, inclusive o quantum de ICMS destacado na nota fiscal” (grifos nossos e do autor).

O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, resume a controvérsia discutida nos autos nos seguintes termos: o juiz julgou procedente o pedido e concedeu a segurança pleiteada para reconhecer o direito da impetrante de excluir da base de cálculo da Cofins e do PIS a parcela relativa ao ICMS destacado da nota fiscal, bem como para declarar seu direito de compensar os valores indevidamente recolhidos a esse título, observado o prazo prescricional. (grifos nossos)

E conclui, em seu voto, que: o valor referente ao ICMS destacado em nota fiscal não é transferido automaticamente, nem é vinculado ao recolhimento do tributo como se permanecesse intangível no caixa do contribuinte de direito até sua entrega ao erário estadual. (grifos nossos)

Além disso, o ministro Dias Toffolli ratifica todos esses aspectos, inclusive referindo-se ao RE nº 240.785: como no julgamento do multicitado RE nº 240.785/MG, para se justificar a natureza de mero “ingresso” do ônus financeiro do ICMS embutido no preço da mercadoria, se deu muita ênfase ao fato de o imposto ser destacado na nota fiscal, valho-me, mais uma vez, das lições proferidas pela ministra Ellen Gracie no julgamento do RE nº 582.461/SP: (…) – grifos nossos e do autor

Assim, não há dúvidas de que, considerando todos os elementos da decisão proferida pelo STF, especialmente os votos vencidos proferidos (que integram o julgado de forma a possibilitar o entendimento de sua extensão), o STF concluiu pela exclusão de todos os valores de ICMS da base de cálculo da Contribuição ao PIS da Cofins, quer tal montante tenha sido pago ou destacado, pois não constitui receita/faturamento do contribuinte.

Por outro lado, a modulação de efeitos da decisão judicial proferida, especialmente na forma como solicitada pela Procuradoria da Fazenda Nacional, não se aplica a esse caso.

A uma porque a técnica da modulação deve ser utilizada em casos de alteração jurisprudencial[2], o que não se verifica nessa hipótese, a medida em que o próprio STF, desde 2014 (RE 240.785), entende pela exclusão do ICMS da base de cálculo dos tributos em comento.

A duas porque o pedido da Procuradoria para que a inconstitucionalidade somente tenha efeitos após o julgamento dos embargos de declaração viola a própria finalidade da modulação, que é resguardar as relações jurídicas consolidadas no tempo.

Ora, desde 2014 os contribuintes vêm se pautando – inclusive, por meio de decisões transitadas em julgado – nos precedentes do STF a respeito da matéria.

Uma alteração brusca de entendimento, especialmente nos moldes requeridos pela Procuradoria violaria a segurança jurídica, que é um dos fundamentos necessários para aplicação da modulação.

Sacha Calmon Navarro Coêlho nos ensina que: “A segurança jurídica diz respeito à previsibilidade e a certeza de que a lei será aplicada pela Administração e pela jurisdição às situações da vida tal e qual vêm sendo aplicada, como de conhecimento geral, a permitir que o jurisdicionado planeje e ordene os seus comportamentos com confiança na lei, supondo que numa comunidade jurídica deve imperar a boa-fé como regra de decisão de todos os seus partícipes”.[3] (g. n.).

Portanto, inadmissível a modulação nesse caso, visto que os contribuintes confiaram no comando exarado pelo STF, planejando e ordenando os seus comportamentos nesse sentido.

Por outro giro, em linha com o acima exposto, caso a modulação fosse admissível, deveria resguardar os fatos passados e devidamente consolidados em decorrência do transcurso do tempo até a publicação do acórdão que julgar os referidos embargos de declaração e os contribuintes que ingressaram com ações judiciais, pois, em prol da segurança jurídica e da boa-fé, deve prevalecer a confiança dos jurisdicionados no precedente proferido pela Corte Suprema, cujo entendimento, repita-se, surte efeitos concretos desde 2014.

[1] Art. 941 (…) § 3º O voto vencido será necessariamente declarado e considerado parte integrante do acórdão para todos os fins legais, inclusive de pré-questionamento.

[2] CPC, art. 927:  § 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica. (g. n.)

[3] COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. A Modulação dos Efeitos Temporais das Decisões Constitucionais em Matéria Tributária. In: ROCHA, Valdir de Oliveira. (Org.). Grandes Questões Atuais de Direito Tributário. 12. ed. São Paulo: Dialética, v. 13, 2009.

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