Até o momento, três ministros acompanharam voto do relator, ministro Gilmar Mendes, de que percentual pode ser flexível.
Nesta quinta-feira, 5, STF começou a julgar, em sessão plenária, duas ações que questionam o percentual de ressarcimento destinado aos exportadores vinculados ao regime do Reintegra – Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários.
O que é o Reintegra?
É um programa do governo brasileiro que visa aumentar a competitividade das empresas exportadoras, devolvendo parte dos tributos pagos na produção de bens industrializados destinados ao exterior. A devolução pode ocorrer via créditos tributários ou pagamento em espécie, compensando tributos indiretos não reembolsados na cadeia produtiva.
O caso era analisado no plenário virtual, e contava com votos do relator, ministro Gilmar Mendes, que, acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes e Dias Toffoli, entendia pela improcedência da ação. No plenário físico, os votos foram reiterados.
Ministro Edson Fachin havia inaugurado divergência, também reiterada em plenário físico e, nesta oportunidade, acompanhada pelo ministro Luiz Fux.
O julgamento foi suspenso, ainda sem data agendada para retorno em pauta.
Casos
A ADIn 6.040 foi proposta pelo Instituto Aço Brasil e questiona a constitucionalidade de partes da lei 13.043/14 e do decreto 8.415/15, que regulam o Reintegra.
O Aço Brasil busca a remoção da expressão “estabelecido pelo Poder Executivo” do art. 22 da lei e a interpretação de outros dispositivos para garantir a recuperação total dos resíduos tributários pelos exportadores.
Já a ADIn 6.055, proposta pela CNI – Confederação Nacional da Indústria também questiona a constitucionalidade do Reintegra, argumentando que o Poder Executivo não pode reduzir o percentual de ressarcimento ao exportador sem justificativa.
Defesa
Em defesa do Instituto Aço Brasil, a advogada Daniella Zagari Gonçalves, do escritório Machado Meyer Advogados, ressaltou a importância da recuperação de resíduos tributários como medida para garantir a imunidade das receitas de exportação às contribuições sociais, conforme previsto no art. 149, § 2º, I da CF.
A argumentação centrou-se no respeito ao princípio do destino nas transações internacionais, que visa desonerar exportações e garantir concorrência justa.
Segundo a advogada, o programa Reintegra, que deveria devolver tributos acumulados, vem sendo tratado como um mero benefício fiscal, com manipulações de alíquotas que prejudicam a competitividade do Brasil no mercado global, especialmente no setor de aço.
Ela ainda destacou que o decreto 1.751/95, ao internalizar o acordo sobre subsídios e medidas compensatórias, reforça que a devolução de tributos não é subsídio.
A advogada criticou a utilização equivocada pela Fazenda Nacional de decisões do STF, como no caso do tema 475 e do RE 474.132, afirmando que essas decisões envolvem materialidades distintas e não aplicam corretamente a imunidade das exportações.
Concluiu que a correta aplicação do Reintegra é essencial para eliminar resíduos tributários que prejudicam a competitividade brasileira, removendo obstáculos ao desenvolvimento econômico do país no cenário internacional.
Para ilustrar o argumento, fez referência ao poema “No Meio do Caminho”, de Carlos Drummond de Andrade, afirmando que resíduos seriam uma “pedra” a ser retirada “do meio do caminho” para que produtos exportados pelo Brasil alcancem competitividade.
AGU
Representando a Fazenda Nacional, a procuradora Patrícia Grassi Osório argumentou que há uma tentativa de confundir o regime de imunidade com os custos tributários dos produtos exportados, ressaltando que as imunidades tributárias não se estendem a toda a cadeia produtiva.
Segundo a procuradora, a tese de desoneração irrestrita, embora desejável, não está prevista na Constituição Federal, nem foi adotada pelo STF. Destacou que o Reintegra é um programa Federal de fomento econômico e não uma regra imunizante, sendo permitido pela legislação a redução de seus benefícios.
A procuradora também afirmou que o Brasil, ao defender o Reintegra na OMC, não negou que o programa seja uma subvenção, mas argumentou que não se trata de uma subvenção vedada ou específica. Por fim, frisou que os resíduos tributários na cadeia produtiva variam segundo o setor, o que levanta questões complexas sobre a compatibilidade desses resíduos com o pacto federativo, especialmente em setores onde o ICMS e o ISS têm papel significativo.
Ao final, também homenageou Drummond, referindo-se ao verso “de tudo fica um pouco”, do poema “Resíduo”. A procuradora concluiu que, embora indesejado, o “resíduo tributário” é constitucional.
Voto do relator
Ministro Gilmar Mendes, relator da ação, destacou que o Reintegra não se trata de imunidade tributária, mas sim de subvenção econômica.
Afirmou que o regime visa compensar parcialmente tributos não recuperáveis ao longo da cadeia de produção, estimulando a competitividade internacional da indústria nacional.
Ressaltou que o percentual de reintegração, estabelecido por lei entre 0,1% e 3%, está sujeito à discricionariedade do Poder Executivo, conforme políticas fiscais e econômicas em vigor.
Além disso, o relator salientou que o Reintegra é compatível com as normas internacionais de comércio, como o GATT – Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio e com o ASMC – Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias.
O ministro afirmou que o benefício não se enquadra como subsídio governamental vedado, já que sua função é devolver resíduos tributários, e não fornecer vantagem competitiva indevida.
Nesse sentido, votou pela validade do decreto 8.415/15 e manteve a redução do crédito no Reintegra, reconhecendo a legitimidade da política econômica adotada.
O relator foi acompanhado pelos ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes.
Voto-vogal
No plenário virtual, ministro Dias Toffoli, em voto-vogal, seguiu o relator pela validade do decreto, mas argumentou que, a redução do percentual deve ser feita com cautela.
Tal cautela teria como base o princípio do não-retrocesso, segundo o qual, a proteção constitucional, uma vez garantida, não poderia ser reduzida ou limitada, exceto em circunstâncias que garantam outra proteção igualmente relevante ou mais importante.
Ainda assim, Toffoli afirmou que, no caso, a redução promovida pelo Executivo é válida, pois dentro dos limites da discricionariedade e da política econômica.
Divergência
Ministro Edson Fachin, no plenário virtual, reconheceu que a prerrogativa do Poder Executivo para alterar os percentuais do Reintegra não poderia ser exercida de maneira discricionária, sem uma justificativa técnica sólida.
Fachin destacou que o programa, ao contrário de um mero benefício fiscal, visa assegurar a aplicação do princípio do país de destino, que desonera exportações e onera importações, favorecendo a balança comercial do país.
Argumentou que as sucessivas reduções do percentual de ressarcimento, feitas pelos decretos 8.415/15 e 9.393/18, não foram acompanhadas de estudos técnicos adequados para mensurar o impacto sobre as exportações ou o montante de resíduos tributários ainda não compensados.
Dessa forma, considerou que as alterações violaram o princípio da segurança jurídica e a confiança legítima dos exportadores, que estruturaram seus negócios com base na política pública estabelecida.
Assim, votou por declarar parcialmente inconstitucional a expressão “estabelecido pelo Poder Executivo” contida no caput do art. 22 da lei 13.043/14, assim como a expressão “de 3%” constante do caput do art. 2º do decreto 8.415/15.
Também votou por anular os §§ 7º e 8º do mesmo decreto, assegurando que os exportadores tenham direito ao ressarcimento integral dos resíduos tributários, mediante comprovação da carga tributária acumulada em cada produto exportado.
Nesta quinta-feira, 5, ao votar, ministro Luiz Fux expressou preocupação com a nova metodologia adotada no programa Reintegra, afirmando que essa alteração pode resultar no aumento de tributos, o que contraria a lógica de não exportar impostos e busca tornar os produtos brasileiros mais competitivos no mercado internacional.
Segundo Fux, estudos indicam que essa mudança pode prejudicar a economia nacional devido à perda de competitividade dos produtos no exterior. Além disso, destacou que essa majoração tributária contraria compromissos assumidos pelo Brasil em acordos internacionais, afetando diretamente o preço das exportações.
O ministro considerou mais eficiente a interpretação do ministro Edson Fachin, que oferece uma visão mais pragmática e ajustada ao sistema de Justiça.
Processos: ADIns 6.040 e 6.055
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