O Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou em repercussão geral que a majoração em mais de cinco vezes da taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex) por meio de portaria é inconstitucional. A decisão foi tomada em plenário virtual, com votação finalizada na última sexta-feira (10/4).
Estava em discussão o fato de em maio de 2011 o então Ministério da Fazenda ter elevado a taxa Siscomex de R$ 30 para R$ 185, por meio da portaria 257/2011. A taxa é cobrada a cada registro de Declaração de Importação (DI). Para adicionar mercadorias à DI, em 2011 a taxa subiu de R$ 10 para R$ 29,50. Originalmente, a taxa foi instituída em 1998 pela lei 9.716/1998.
Os setores mais afetados pelo reajuste dependem de insumos que são produzidos apenas no exterior, cuja importação é indispensável para realizar a industrialização no Brasil. É o caso das indústrias automotiva, química, farmacêutica, de energia e de tecnologia. Em alguns segmentos, a dependência de insumos importados pode beirar 100%.
A 1ª Turma do Supremo, ao analisar a matéria em 2017 no RE 959.274, entendeu que o aumento foi inconstitucional por ter sido desproporcional a índices oficiais de reajuste. Apesar de a lei ter delegado ao Executivo o poder de atualizar a taxa, o STF ressaltou que isso não significa um cheque em branco para a União ajustar de maneira indiscriminada. Em 2018, por meio do RE 1.095.001, a 2ª Turma se alinhou à 1ª Turma.
O posicionamento das Turmas foi reiterado nesta sexta-feira pelo plenário virtual, quando os ministros analisaram o mérito da questão com repercussão geral reconhecida no tema 1.085, cujo leading case é o RE 1.258.934. O entendimento mais recente se deu por maioria, porém o acórdão ainda não foi publicado.
Segundo a tributarista Maria Danielle Toledo, sócia do escritório Lira Advogados, que atuou junto ao Supremo em processos sobre a taxa Siscomex, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) vem determinando a aplicação do INPC como índice de correção da taxa, que subiria de R$ 30 para R$ 69,40. Outros TRFs, no entanto, determinam o retorno da taxa para o valor original até que o Ministério da Economia edite nova portaria instituindo o índice de correção. Caso seja aplicado o IPCA, como a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) vem pedindo em São Paulo, a taxa sobe para R$ 67.
Desde 2018 a procuradoria não vinha mais contestando processos relacionados à majoração da taxa Siscomex. A determinação para desistência de recorrer consta na nota SEI-PGFN 73/2018.
Siscomex e coronavírus: necessidade de caixa
A decisão do STF em repercussão geral é relevante para empresas que enfrentam dificuldades de caixa em decorrência do isolamento social, determinado durante a pandemia do coronavírus. Muitas companhias vêm pedindo na Justiça o adiamento de tributos incidentes na importação, que sofrem restrições à compensação e devem ser pagos por meio de débito na conta corrente vinculada ao sistema Siscomex, implicando desembolso de caixa.
Maria Danielle Toledo frisou que a Corte não modulou os efeitos da decisão tomada em repercussão geral. Com isso, as empresas que ainda não têm ações judiciais podem pedir a devolução dos valores excedentes pagos a título da taxa nos últimos cinco anos.
As companhias que já estavam no Judiciário podem pedir de volta tudo o que foi pago a maior desde a data em que as ações foram propostas – o que, em alguns casos, remonta a 2012. Toledo destaca que a devolução dos valores é essencial para as empresas, já que a taxa não é sujeita à sistemática cumulativa – isto é, não dá direito a crédito.
“Perto do Imposto de Importação (II) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o valor da taxa parece simbólico. Mas quando se faz a estimativa de quanto é pago por ano e por mês a taxa acaba tendo expressividade. Para algumas importadoras as perspectivas de recuperação dos cinco anos passados chega à casa de R$ 10 milhões, R$ 12 milhões”, afirmou.
O tributarista Roberto Duque Estrada, sócio do escritório Brigagão Duque-Estrada Advogados, avaliou que a portaria 257/2011, que determinou o reajuste superior a 500%, fica prejudicada com a decisão do Supremo em repercussão geral.
“A dúvida que fica é com base em que ato administrativo vai se poder cobrar a taxa: o valor original de R$ 30 corrigido pela inflação? Ou na ausência de um novo ato nada pode ser cobrado? Vai depender do que cada contribuinte pediu nos casos concretos”, questionou.
Nesse sentido o tributarista Daniel Szelbracikowski, sócio do Dias de Souza Advogados, avaliou que o Ministério da Economia deveria editar uma nova portaria para prever o reajuste. “Se o critério da portaria de 2011 foi tido como inconstitucional, é clara a necessidade de edição de nova portaria para especificar valores que respeitem o limite da mera atualização monetária a partir de índices oficiais de inflação”, salientou.
Toledo ressalta que a nova portaria só teria condições de regular o reajuste da taxa daqui para frente. “Se o ministério revogar a portaria de 2011, voltaria ao valor original de R$ 30. Tecnicamente seria a postura mais adequada para evitar novas discussões judiciais, mas no meio dessa situação em que estamos qualquer ato por parte da União que regularize isso e dê um alívio de caixa para os contribuintes já seria positivo”.
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