Justiça considerou irregular fórmula que inclui o ICMS na base de cálculo do Pis/Pasep e da Cofins. Distribuidoras podem ficar com parte do dinheiro ou receber ‘prêmio’.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) vai começar a debater como será feita a devolução aos consumidores de uma parte do PIS/Pasep e da Cofins cobrados nas contas de luz nos últimos anos, informou ao G1 o diretor-geral da agência, André Pepitone.
Apesar de o assunto estar em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF), já há sentenças transitadas em julgado que reconhecem o direito a essa devolução. Por isso, há expectativa de que o Supremo acompanhe este entendimento, em decisão que deve sair ainda no primeiro semestre de 2020.
Não há estimativa do valor que será devolvido, mas, de acordo com Pepitone, a cifra deve atingir “alguns bilhões”.
Entenda
O PIS/Pasep (Programa de Integração Social/Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público) e a Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) são tributos federais. A devolução, portanto, deve gerar uma queda na arrecadação do governo federal.
Nos últimos anos, diversas empresas, entre elas distribuidoras de energia elétrica, moveram ações judiciais questionando a forma como são calculados esses tributos. A discordância é sobre a inclusão do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), um imposto estadual, na base da conta.
Tomando-se como exemplo uma conta de luz de R$ 100 e sobre a qual incida ICMS de 30% (valor final de R$ 130). Para o governo, o Pis/Pasep e a Cofins devem ser calculados sobre os R$ 130. Nas ações judiciais, as empresas defendem que a conta deve ser feita sobre os R$ 100.
Pelo menos duas distribuidoras – Cemig, que atende ao estado de Minas Gerais, e Light, que atende parte dos consumidores do Rio de Janeiro – conseguiram decisão judicial transitada em julgado reconhecendo que o cálculo não deve considerar o ICMS.
As decisões, do ano passado, geraram um redução imediata no valor das tarifas de energia, de 1%, para os mineiros, e de 2%, para os cariocas.
Entretanto, as decisões judiciais têm efeito retroativo, ou seja, têm validade a partir da data de entrada da ação. É esse valor, chamado de passivo, que a Aneel vai discutir como devolver aos consumidores. Apenas a Light, que entrou com a ação em 2007, estima que têm a receber R$ 3,6 bilhões do governo federal.
Já a Cemig prevê ter direito a outros R$ 4,1 bilhões em imposto repassado a mais nos últimos dez anos.
Prêmio’ para as distribuidoras
A Aneel não sabe quantas distribuidoras conseguiram decisão da Justiça retirando o ICMS do cálculo do Pis/Pasep e da Cofins. Por isso, vai anunciar ainda nesta semana a abertura de um processo para ouvir as distribuidoras, estimar o valor do passivo a ser devolvido aos consumidores e definir de que forma isso será feito. O resultado deve sair em cerca de 30 dias.
De acordo com Pepitone, “há teses jurídicas” que indicam que uma parte desse dinheiro deve ficar com as distribuidoras. Uma dessas teses aponta que apenas o imposto a mais cobrado nos últimos 10 anos devem ser devolvido aos consumidores. Outra defende que deve ser restituído apenas o que foi cobrado a mais nos últimos cinco anos.
O processo movido pela Cemig teve decisão em 2019 mas os seus efeitos retroagem a 2003. Se fosse aplicada a tese de devolução de apenas 5 anos de imposto à população, a empresa poderia embolsar o equivalente a 11 anos de Pis/Pasep e Cofins cobrado a mais.
A possibilidade de ficar com uma parte do imposto, diz Pepitone, foi o que levou as distribuidoras a mover as ações – os tributos, independente da forma como são calculados nas contas de luz, são repassados integralmente aos consumidores, ou seja, não afetam o caixa das distribuidoras.
“A Aneel já tem o entendimento de que esse recurso é todo do consumidor”, disse o diretor-geral da Aneel.
Questionada pelo G1, a Light informou que moveu a ação porque “entende haver bitributação ao incluir o ICMS na base de cálculo da apuração do Pis/Cofins.” Já a Cemig disse que “entendia que a inclusão do ICMS na base de cálculo do Pasep/Cofins era inconstitucional.”
Pepitone apontou, entretanto, que pode ser discutido o pagamento de um “prêmio” às distribuidoras, para, por exemplo, cobrir os custos com o processo.
“A gente reconhece que esse recurso [a ser devolvido aos consumidores] só existe pelo fato de a distribuidora ter ido litigar em juízo. Se não tivesse feito isso, não teria esse passivo que estamos falando. Então, vamos discutir com o mercado se é justo ou não o reconhecimento de um prêmio”, disse Pepitone.
Conversa com o governo
O diretor-geral da Aneel disse ainda que vai procurar o governo para discutir a devolução dos valores aos consumidores. De acordo com ele, o Ministério de Minas e Energia vai intermediar esse debate.
A retirada do ICMS da base de cálculo do Pis/Pasep e Cofins reduz o valor que o governo federal arrecada com os tributos sobre a conta de luz. E a devolução de parte do valor recolhido em anos anteriores deve prejudicar ainda mais as contas públicas, que vêm registrando rombos bilionários nos últimos anos.
Procurado pelo G1, o Ministério da Economia informou que “não se manifesta sobre matéria ainda em estudo, análise e/ou não publicada.”
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